terça-feira, 30 de setembro de 2014


Lenda do milagre de Ourique


Muito se tem falado, discutido e escrito sobre o já famoso milagre de Ourique. Porém, a nós, interessa-nos apenas o verdadeiro aspecto lendário de cada história – aquele meio-termo que se situa sempre entre a realidade e o sonho, entre o natural e o sobrenatural, entre a banalidade das coisas correntes e a poesia das coisas raras. Por essa razão, voltando as costas às polémicas acesas em torno do caso, vamos contar aqui apenas a lenda – sem dúvida uma das mais belas lendas de Portugal.

A batalha de Ourique tem sido considerada por muitos «a pedra angular da monarquia portuguesa». Diz-se que foi aí que pela primeira vez os nobres aclamaram D. Afonso Henriques rei de Portugal.


Fins de Julho de 1130. D. Afonso Henriques, já com a retaguarda coberta por castelos e cidades cristãs, já na posse de Leiria, de Ourém, Penela, Almourol, Zêzere e Cera – que depois adoptou o nome de Tomar – julgou-se apto a poder aventurar-se pelo território dos mouros, levando as suas armas pelo Alentejo, talvez na direcção de Silves. Reuniu os seus homens e lançou-se ao caminho.

A notícia desta agressão do infante D. Afonso fez tremer de receio Ismael ou Ismar, que então governava esta parte da Península ainda em poder dos sarracenos. Imediatamente ele convocou os chefes e guerreiros de Sevilha, Badajoz, Elvas, Évora e Beja, bem como os de todas as praças fortes até Santarém. E os sarracenos acorreram de toda a parte. Os exércitos marchavam um contra o outro. Mas por alturas do Campo de Ourique fez-se alto de ambos os lados. Então, João Fernandes de Sousa, camareiro do infante, apressou-se a entrar na tenda do seu senhor. D. Afonso Henriques parecia dormitar, tendo sobre os joelhos o Velho Testamento.

— Senhor... Perdoai-me se vos acordo...

D. Afonso Henriques nem pestanejou. Aflito com o rumor dos homens, lá fora, pois começavam a recear a multidão enorme de mouros que estava em frente e à vista, João Fernandes tocou no ombro do vencedor da batalha de S. Mamede.

— Acordai, Senhor meu!

O Velho Testamento caiu no chão. D. Afonso Henriques olhou o seu camareiro como se o tivesse visto pela primeira vez:

— Que me quereis? Estava a dormir... e a sonhar...

— Perdoai-me se vos interrompi... Mas está lá fora um homem velho que vos quer falar.

— Donde vem?

— Vem daqui perto e insiste em ser recebido por vós.

— Se é cristão, pode entrar.— Está aqui, meu Senhor.

E voltando-se para o velho, João Fernandes indicou com a mão direita a entrada da tenda.

— Por aqui. E não vos demoreis!

O velho entrou, olhando fixamente Afonso Henriques. Este, porém deu quase um salto no escabelo onde estava sentado.

— Senhor! Acabo de vos ver em sonhos! Que me quereis?

— Dizer-vos, Senhor, que deveis ter bom coração, porque vencereis e não sereis vencido. Sois amado do Senhor, porque sem dúvida Ele pôs sobre vós e sobre a vossa geração os olhos da Sua Misericórdia, até à décima sexta descendência, na qual se diminuirá a sucessão. Mas nela, assim diminuída, Ele tornará a pôr os olhos e verá! Ele me mandou dizer-vos que na noite que se seguirá a esta, se ouvirdes a sineta da minha ermida, na qual vivo há sessenta e seis anos, guardado no meio dos infiéis por alto favor de Deus – pois, como ia dizendo, se ouvirdes a sineta, deveis sair fora do arraial, sozinho.

D. Afonso arriscou:

— Devo sair de noite, sem companhia?

O velho voltou à sua fala serena:

— Sim, saireis sozinho, porque Ele vos quer mostrar a Sua grande Piedade.

— Senhor! Se sois um embaixador de Deus, eu vos venero e sabei que tudo farei para ser digno de tão grande mercê!

Sem mais palavras, o velho saiu da tenda. D. Afonso veio aliás dele. Em breve o perdia de vista. Entretanto, inquietos, os soldados discutiam. Logo se aproximou João Fernandes. D. Afonso Henriques perguntou-lhe:

— Que dizem os nossos homens?

— Acham uma temeridade o que ides fazer, Senhor! Os sarracenos têm aqui cinco reis e cinco exércitos para nos combaterem!

— Reúne-os! Quero falar-lhes.

Era quase noite quando D. Afonso Henriques se dirigiu aos seus homens:

— Companheiros! Nem paz, nem trégua, nem fuga se nos consente! É infalível, o pelejar aqui. Cinco exércitos nos cercam. Nós não poderemos ter mais socorros além daquele que nos vier de Deus. Mas n’Ele confio! Ele, Senhor de todos os exércitos, estará connosco! E connosco Ele vencerá em nós, e nós sobre esses homens que O não aceitam porque O não conhecem! Na madrugada de amanhã será a batalha. Encomendemos pois a Deus, esta noite, a nossa causa! E entretanto... esperemos que a hora soe!

Os homens entreolharam-se, sem saberem que dizer. Acreditavam no seu chefe e acreditavam na causa que os trouxera ali. Todavia, a vista da massa imensa do inimigo, muito maior do que eles em número, punha nesses homens um certo receio, perfeitamente humano...

O dia seguinte decorreu sereno. A noite chegou. Nem cá nem no arraial fronteiro havia movimento de tropas. Observava-se um silêncio enervante. De repente, esse silêncio foi cortado pela voz dorida de um sino que tangia ao longe. D. Afonso Henriques, curvado numa oração muda, ergueu-se e dirigiu-se lentamente para fora do arraial. A mão na espada, o olhar vivo e atento, D. Afonso Henriques caminhou sozinho. Já fora das vistas dos seus homens e em plena escuridão, o jovem chefe guerreiro deu conta de um raio resplandecente que surgia do seu lado direito. D. Afonso estacou. Mas o raio de luz foi alargando, alargando iluminando tudo em redor. De súbito, D. Afonso Henriques distinguiu o Sinal da Cruz mais resplandecente que o Sol e Jesus Cristo crucificado nela. De um lado e de outro, grupos de anjos, vestidos de branco, de um branco que resplandecia também!

O coração de D. Afonso Henriques bateu forte. Num gesto rápido, atirou para o chão a espada e o escudo. Descalçou-se em sinal de vassalagem e lançou-se de bruços, com as lágrimas a correrem-lhe pelo rosto. O peito arfante, nem atinava com o que queria dizer.


— Senhor!... Por que me apareceis?... Que me quereis dizer?... Desejareis, por ventura, acrescentar fé a quem tanta traz no peito? Se o inimigo Vos pudesse ver, como eu Vos estou vendo, talvez esse pudesse acreditar em Vós! Por mim, creio que sois Deus Verdadeiro, Filho da Virgem e do Padre Eterno!

Calou-se D. Afonso Henriques. Ergueu um pouco o busto, olhando uma vez mais a cruz levantada da terra cerca de dez côvados. E então a voz do Senhor fez-se ouvir, serena e bela:

— Afonso! Não te apareci deste modo para acrescentar a tua fé em mim, mas para fortalecer o teu coração neste conflito, e fundar os princípios do teu reino sobre pedra firme. Confia, Afonso, porque não só vencerás esta batalha, mas todas as outras em que pelejares contra os inimigos da minha Cruz. Vai! Vai, que acharás a tua gente alegre, esforçada para a peleja, e pedir-te-ão que entres na batalha com o título de rei. Não ponhas dúvida! A quanto te pedirem, deves conceder facilmente. Eu sou o fundador e destruidor dos reinos e impérios. Em ti e teus descendentes, quero fundar para mim um império, por cujo meio seja meu nome publicado entre as nações mais estranhas. E para que os teus descendentes conheçam quem lhes dá o reino, comporás o escudo de tuas armas com o preço com que eu remi o género humano. Olha para o meu corpo e contempla as minhas chagas! A elas juntarás o preço com que fui comprado aos Judeus. Assim esse reino ser-me-à santificado, puro na fé e amado por minha Piedade!


Calou-se, o Senhor. Os anjos vestidos de branco luzente sorriam. Então D. Afonso Henriques tentou dizer algo:

— Senhor!... Por que méritos me mostrais tão grande misericórdia? Olhai na verdade para os meus sucessores e guardai salva a gente portuguesa! Se acontecer que tenhais contra ela algum castigo, executai-o antes em mim e em meus descendentes, e livrai este povo que amo como único filho!

De novo a voz do Senhor voltou a cortar a escuridão e o silêncio:

— Não se apartará deles nem de ti nunca a minha Misericórdia, porque por sua via tenho em vista grandes searas e a eles escolhidos por meus segadores em terras mui remotas. E agora, volta para a tua tenda. Um novo caminho vai abrir-se!

Calou-se a voz e desapareceu a luz. Um silêncio quase aflitivo deu o braço à escuridão. D. Afonso Henriques ergueu-se. A hora devia ir avançada e no arraial já talvez tivessem dado pela sua ausência. Tomou o escudo e a espada, e voltou serenamente para a sua tenda. Ao chegar, João Fernandes de Sousa e mais três homens da sua confiança esperavam-no com certa impaciência.

— Senhor, como tardastes!

— Estai calmos, que a vitória será nossa. Como estão os nossos homens?

— Bem, Senhor. Ansiosos que a manhã chegue para que seja dado o sinal de combate!

— Pois se estão assim ansiosos, ide reuni-los e prepará-los. Iniciaremos a luta antes mesmo que a manhã desponte!

A batalha travou-se, dura. Desde as primeiras horas da manhã até à noite que os soldados de D. Afonso viam chegar hordas de sarracenos, como se fossem em número jamais capaz de extinguir-se. O arraial era acometido por todos os lados; e dir-se-ia que a sorte não ficaria com eles, quando um troço de cavalaria escolhida, caindo sobre a primeira coluna sarracena, a separou do resto do exército, dizimando-a. Perto, andava Ismael, que ao ver completamente derrotada a sua primeira coluna e vendo o arrojo com que os portugueses lutavam, indiferentes ao perigo, prontos a vencer ou a morrer, encheu-se de um pavor súbito e fugiu. Então o resto do exército, vendo em fuga o seu rei, seguiu-o em debandada. As forças portuguesas foram-lhe no encalço.


O desbarato dos sarracenos foi total. Um monte de cadáveres cobria o terreno desde Ourique até às Cabeças de Reis – onde os cinco reis mouros foram degolados. E em campo aberto, loucos pela vitória, os homens de D. Afonso Henriques aclamaram-no rei pela primeira vez! E ali mesmo o primeiro rei de Portugal resolveu que a bandeira portuguesa passasse a ter cinco escudos em cruz, representando os cinco reis vencidos e as cinco chagas de Cristo, carregadas com os trinta dinheiros por que Judas vendeu o Redentor. A 25 de Julho de 1139, a vitória de Ourique impôs para todo o sempre as cinco quinas na bandeira de Portugal.




        

segunda-feira, 29 de setembro de 2014


Quando um Estado não se dá ao respeito


Pedro Quartin Graça

Selvagens:
independentistas vão pagar multa
de quatro euros


Os dois independentistas das Canárias, membros do ANC com ligações à Frente Polisário, que, na segunda-feira, protagonizaram um protesto nas Ilhas Selvagens, ficaram alojados num hotel no Funchal, Madeira, não foram detidos e, inclusive, «apanharam uma boleia» da Marinha no seu regresso ao Funchal por não disporem de meios de transporte.

Pela invasão e ocupação do território nacional foram multados em, pasme-se, apenas quatro(!!!) euros, por terem pernoitado nas Ilhas Selvagens, sem autorização da gestão do Parque Natural da Madeira. Foram, ademais, muito bem tratados pela Marinha e pelas autoridades portuguesas.

Eis o resultado da forma ligeira como o Governo de Portugal tratou do assunto. Da forma ligeira e, sobretudo, do erradíssimo entendimento que por parte dos governantes portugueses existiu relativamente ao incidente em causa.

A este propósito, vejam-se as nossas próprias declarações ao Diário de Notícias da Madeira:

«Quando uma parte do território é ocupada e hasteiam uma bandeira que não é nossa o mínimo é enviarem meios aéreos e não um barco» (...) «O Governo reagiu de forma muito lenta e pouco ousada» (...) «os poucos recursos alocados à defesa fazem com que «nos tomem o pulso e façam o que entendem». (...)  «Há uma parte do território ocupado e o Governo português está mudo» (...) «Isto não é mais um incidente, faz parte de uma escalada de incidentes e desta vez até foram mais longe» (...) e, por último, é «inacreditável que um Governo não reaja de forma firme a um desaforo destes». «Quem está a reagir é a sociedade civil», concluímos, não deixando de apontar a «irresponsabilidade total» do Governo da República já que (...) «o facto de se tratar de um movimento separatista não é caso para desvalorizar a questão, já que há vários exemplos destes pelo mundo em que se põe em causa a soberania dos países.»

Esta atitude do Governo português é demonstrativa de uma enorme incapacidade de análise e de total ausência de sentido de responsabilidade que seria expectável por parte de um Governo que encarasse de forma séria a conjuntura geo-estratégica internacional. Estamos, infelizmente, entregues a um grupo de amadores.



COMENTÁRIO:

Daquela inteligência em Ministro da Defesa, que já promoveu exercícios militares com o arqui-inimigo castelhano para poupar dinheiro, o que se esperava?

Sem dúvida que Aguiar Branco é a maior galinha tonta que já passou pela Defesa Nacional desde que Portugal existe. O Botelho Moniz e mesmo o Silvano Ribeiro, este Ministro da Defesa do Vasco Gonçalves, comparados com esta galinha tonta, eram capazes de ser inteligentes e patriotas.





domingo, 28 de setembro de 2014


Revista Fortune desmente mito

das «grandes riquezas» do Vaticano


A revista norte-americana Fortune, especializada em temas económicos, desmentiu o mito das «grandes riquezas» do Vaticano, e informou que se a Santa Sé fosse uma corporação, nem sequer chegaria perto das 500 mais ricas da sua famosa lista Fortune 500.

No seu artigo intitulado «This pope means business» («Este Papa leva a sério»), a Fortune indicou que «frequentemente é assumido que o Vaticano é rico, mas se fosse uma companhia, não chegaria nem perto da lista Fortune 500».

A Fortune assinalou que o orçamento operacional do Vaticano é de apenas 700 milhões de dólares, e «em 2013 registou um pequeno superávit global de 11,5 milhões de dólares».

A revista estadunidense assinalou, além disso, que a maioria dos activos mais valiosos do Vaticano, «alguns dos maiores tesouros de arte do mundo, estão praticamente sem avaliação e não estão à venda».

«A Igreja Católica é altamente descentralizada financeiramente. Em termos de dinheiro, o Vaticano basicamente está por conta. Essa é uma importante razão pela qual as suas finanças são muito mais frágeis e a sua situação económica é muito mais modesta que a sua imagem de luxuosa riqueza».

O Vaticano, indicou a revista económica, não tem acesso ao dinheiro nem das dioceses nem das ordens religiosas.

Explicou que «cada diocese», em termos económicos, «é uma corporação separada, com os seus próprios investimentos e orçamentos, incluindo as arquidioceses metropolitanas».

A Fortune assinalou que as dioceses de todo o mundo «mandam quantidades importantes de dinheiro para o Vaticano todos os anos, mas a maior parte deste dinheiro é destinada ao trabalho missionário ou às doações de caridade do Papa».

O Vaticano, indicou, «paga salários relativamente baixos, mas oferece benefícios generosos de saúde e aposentadoria».

«Os cardeais e bispos das congregações e dos conselhos muitas vezes não recebem mais de 46 mil dólares por ano».

«Os empregados leigos do Vaticano têm emprego vitalício, e praticamente ninguém se aposenta antes da idade», assinalou.






Mais uma vez, o Alegre fica a chupar no dedo

Brandão Ferreira absolvido


Heduíno Gomes

Não é de hoje que o enxofrável Alegre põe processos a quem contraria as suas sábias e revolucionárias opiniões. Já quando era Secretário de Estado da Comunicação Social, nos anos 70, o «democrata» Alegre perseguia quem se lhe opusesse. Por isso foi baptizado de coroné, numa alusão a uma sinistra personagem da telenovela Gabriela.

Agora, finalmente, foi lida a sentença do julgamento que mais recentemente opôs o coroné Manuel Alegre ao TC Brandão Ferreira, acusado de difamação... O réu foi absolvido.





Eis parte da noticia da Lusa que reflecte a decisão e o que se passou.

O tenente-coronel aviador (na reforma) Brandão Ferreira e o director do semanário 
O Diabo, Esteves Pinto, foram hoje absolvidos do crime de difamação contra o histórico dirigente socialista Manuel Alegre.

«O tenente-coronel João José Brandão Ferreira foi julgado por difamação por causa de artigos publicados em blogues, tendo o arguido reiterado em julgamento a tese que Manuel Alegre cometeu, aos microfones da rádio Voz da Liberdade, em Argel, traição à pátria, ao incitar os militares portugueses a desertar, ao conviver com os líderes dos movimentos de libertação de Angola, Moçambique e Guiné e ao ajudá-los na guerrilha contra as tropas portuguesas no Ultramar.»